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O vazio depois do pico: e agora que deu certo?
BoitãoNews - Edição #007


Ninguém te prepara pro silêncio que vem depois de vencer.
Todo mundo fala da jornada até o topo.
Dos sacrifícios.
Das madrugadas.
Do medo de dar errado.
Da dúvida no meio do caminho.
Mas ninguém te prepara pro que acontece quando dá certo.
Quando você lança e converte.
Quando o lead entra.
Quando o resultado vem.
Quando o elogio chega.
Quando o público cresce.
Quando o “deu bom” finalmente acontece.
E mesmo assim… você sente um certo eco.
Uma espécie de pausa interna que não era pra estar ali.
Um silêncio incômodo que diz:
“Tá. E agora?”
A conquista que esvazia

A sensação pode ser sutil.
Você comemora no primeiro dia.
Compartilha os prints no segundo.
Mas no terceiro… já começa a se perguntar qual é a próxima.
E essa pergunta, por trás do verniz de ambição, carrega um sintoma:
A incapacidade de habitar a própria conquista.
É como se viver no “pico” te distanciasse da presença.
E isso acontece com mais gente do que se imagina.
A gente aprende a subir, a performar, a perseguir.
Mas não aprende a ficar. A sustentar. A respirar onde chegou.
Porque quando tudo gira em torno da próxima meta, até o sucesso vira só um ponto de passagem.
A síndrome do pós-pico

Esse fenômeno tem nome — e não é só seu.
Chamam de "síndrome do sucesso" ou “post-achievement depression”.
Um estudo da Ohio State University (2013) mostrou que a realização de objetivos muito intensos ou idealizados tende a ser seguida por quedas abruptas no bem-estar emocional.
Por quê?
Porque o cérebro humano libera mais dopamina durante o esforço do que na conquista em si.
A neurociência já provou: o nosso sistema de recompensa é ativado pelo movimento em direção ao objetivo, não pela chegada.
Você acha que quer a vitória.
Mas o que te mantém vivo é o movimento.
E quando a luta acaba… o corpo para, mas a mente não sabe o que fazer com esse silêncio.
É o que levou Michael Phelps, maior medalhista olímpico da história, a mergulhar em depressão logo após seu maior ciclo de vitórias.
O mesmo aconteceu com Elizabeth Gilbert, autora de “Comer, Rezar, Amar”, que entrou em colapso criativo depois do estouro mundial do livro.
A expectativa de plenitude era tão alta… que a realidade não tinha como entregar.
O ator Jim Carrey, depois de atingir fama global e fortuna, declarou numa entrevista:
“Eu desejo que todo mundo consiga ficar rico e famoso e tenha tudo o que sempre sonhou… só pra perceber que isso não é a resposta.”
Ele falou isso após viver uma crise existencial profunda, quando percebeu que o sucesso material não curava o vazio interno — só o mascarava.
Carrey foi de tapetes vermelhos para retiros de silêncio. E hoje fala mais sobre presença, espiritualidade e desapego do ego do que sobre cinema.
Isso não é coincidência. É ciclo.
O marketing e o ciclo do “nunca basta”

E aí entra o nosso contexto:
O marketing digital. O tráfego pago. O direct response.
Um ecossistema onde:
A métrica dita o humor.
O ROAS dita o valor.
A comparação dita o ritmo.
E o topo… nunca é o suficiente.
Você bate a meta.
Alcança o número.
Entrega o resultado.
E 48h depois, alguém já fez melhor.
Alguém já escalou mais.
Alguém já criou outra coisa.
A régua não para de subir.
E sua sensação de presença não para de descer.
Vivemos um ciclo de dopamina e frustração:
Corre > alcança > esvazia > corre de novo.
É o que o psicólogo Tal Ben-Shahar, de Harvard, chama de “a armadilha do hedonismo progressivo”.
Você precisa de cada vez mais estímulo externo pra sentir o mesmo prazer interno.
Mas nunca dura. Nunca preenche.
O falso preenchimento

A verdade é que a maioria de nós não suporta o vazio.
Então a gente corre pra preencher.
Só que o preenchimento costuma vir disfarçado de produtividade:
Novas metas
Novo projeto
Novo curso
Novo lançamento
Novo desafio
A falsa reinvenção que não nasce da consciência, mas da fuga.
A alma ainda está tentando digerir o ciclo anterior… e o ego já quer começar o próximo.
É nesse ponto que muita gente muda de nicho, de produto, de identidade — não por visão estratégica, mas por não saber como ficar no silêncio.
O topo é um lugar solitário (se você não estiver inteiro)

Não se fala muito disso, mas é comum:
Quanto mais você escala, mais a pressão muda de forma.
Mais se espera de você.
Mais você precisa parecer estável, sólido, pronto.
Mais difícil é dizer: “não sei o que fazer agora.”
E o risco aqui é alto:
Você começar a viver só pela expectativa externa.
Virar refém da próxima grande entrega, mesmo sem ter mais nada pra dizer.
O seu melhor criativo pode nascer do silêncio — se você tiver coragem de não fugir dele.
Em 2022, Ed Sheeran compartilhou que enfrentou crises de ansiedade e exaustão extrema — mesmo estando no auge da carreira, com hits em primeiro lugar e turnês lotadas.
Ele disse:
“Você se acostuma a correr tanto, que não sabe o que fazer quando tudo para. E parar assusta.”
Ele se afastou das redes, mudou sua rotina de criação e começou a gravar músicas “que talvez ninguém escute” — só pra reconectar com o prazer de criar sem expectativa.
O que o vazio está tentando te dizer

Talvez o que você esteja sentindo não seja falta de ambição.
Seja só o peso do excesso não processado.
Esse silêncio pode estar te pedindo:
Tempo
Intenção
Encerramento simbólico
Uma nova relação com a própria entrega
Às vezes, o vazio não é um buraco a preencher.
É um espaço a ser respeitado.
Um lugar de pausa entre dois ciclos.
Um intervalo fértil entre duas versões de você.
E agora? O que fazer com isso?

Não existe fórmula. Mas existem caminhos.
E, às vezes, o caminho certo não é o que resolve rápido, mas o que convida à presença.
1. Crie um ritual de encerramento
Todo ciclo merece um fim digno.
Mas a pressa do “próximo projeto” rouba esse momento.
Ritualizar o fim é criar um marco simbólico entre o que foi e o que vem.
Pode ser um e-mail de encerramento.
Pode ser um texto só pra você.
Pode ser uma reunião com o time.
Ou até algo mais tangível: um presente pra si mesmo — como um relógio, uma caneta, uma peça de arte, algo que marque: “isso aqui teve valor, e eu reconheço.”
O símbolo não é ostentação.
É reconhecimento. É memória física do que não pode ser esquecido.
Quando você não honra um fim, o fim te persegue de forma disfarçada no início seguinte.
2. Revisite suas motivações
Toda meta começa com uma pergunta silenciosa: pra quê?
Mas no meio do caminho, é fácil esquecer.
Você começou pra provar algo?
Pra sair de um lugar?
Pra ser visto?
Pra se salvar?
Não tem resposta errada.
Mas tem respostas que deixam de servir.
Revisitar a origem das suas motivações pode mostrar que você já chegou num destino que nem reconhece mais.
Ou que continua indo por inércia — e não por escolha.
Se você não souber pra quem está performando, sempre vai sentir que está devendo algo.
3. Evite decisões no eco
O pós-pico é fértil, mas também traiçoeiro.
Porque ele parece calmo — mas por dentro ainda reverbera tudo que foi vivido.
É como sair de um palco com os ouvidos zunindo.
A plateia já foi embora, mas o som ainda pulsa por dentro.
Você precisa de silêncio antes de ouvir qualquer outra coisa com clareza.
Trocar de nicho, largar tudo, “começar do zero”...
Pode ser certo.
Mas pode ser só pressa de fugir de um vazio que precisava ser sentido.
Grandes decisões pedem silêncio limpo, não ruído disfarçado de clareza.
4. Crie no off
Crie algo que ninguém vai ver.
De propósito.
Escreva um texto e delete.
Grave um áudio só pra você.
Pinte sem mostrar.
Crie sem a obrigação de ser brilhante, rentável ou genial.
É nesse espaço que você pode lembrar por que começou.
Porque a sua alma criativa não nasceu pra engajar. Ela nasceu pra expressar.
A criação que vem da performance alimenta o jogo.
A que vem do silêncio... salva o jogador.
O que vem depois do depois?

Essa pergunta não tem resposta pronta.
Mas ela precisa ser feita.
Principalmente quando tudo deu certo — e ainda assim… algo ficou suspenso.
A vida não é só escalar.
É também reconhecer o topo.
Descer com leveza.
Descansar sem culpa.
Recomeçar com intenção.
Nem todo vazio precisa ser combatido.
Alguns só precisam ser sentidos.
E talvez — só talvez — o seu próximo grande ciclo não nasça de um brainstorm...
…mas de uma respiração.
— Boitão
📚 Leitura complementar
1. “A coragem de ser imperfeito” – Brené Brown |
2. “Ainda estou aqui” – Marcelo Rubens Paiva |
“Quando Nietzsche Chorou” – Irvin D. Yalom |
![]() | P.S. Essa edição foi útil pra você? Tem sugestões sobre o tema que gostaria de ler numa próxima edição? Responda este e-mail ou comente abaixo. Eu leio cada uma das respostas! |
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